Sustentabilidade

Prévia da COP30: Amazônia, vozes locais e o desafio da coerência global

Prévia da COP30 Amazônia, vozes locais e o desafio da coerência global - Fitec Tec News

Com a 30ª Conferência das Partes (COP30) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima se aproximando, marcada para acontecer em Belém (PA) a partir de 10 de novembro, o Brasil se prepara para sediar o evento em um momento crítico. O ano de 2023, o mais quente já registrado, impõe urgência para que a Conferência, realizada pela primeira vez na Amazônia, consiga transformar ambições em ações concretas.

As expectativas são altas, mas o cenário é complexo. Enquanto o Brasil assume a posição estratégica de ponte diplomática entre o Norte e o Sul Globais, o professor João Alfredo Nyegray, da PUC-PR, alerta que a liderança dependerá da coerência entre discurso e prática, especialmente no que tange a financiamento climático e a exploração de novas fronteiras energéticas.

 

O protagonismo da Amazônia na COP30 e o diferencial das comunidades

O principal diferencial desta COP em relação às edições anteriores é a sua localização, que coloca a Amazônia no centro do debate. Esse simbolismo, no entanto, é confrontado por desafios logísticos e estruturais de Belém, que podem, paradoxalmente, restringir a participação da sociedade civil e de delegações menores.

Contudo, a voz local será inegavelmente mais forte. Fruto de um processo inédito de Deliberação Cidadã, a população amazônica entregará propostas e soluções diretamente no evento. As Assembleias Climáticas do Pará, realizadas em municípios como Barcarena e Magalhães Barata, reuniram moradores, pescadores e extrativistas para deliberar sobre:

  • Financiamento Climático: Propostas de mecanismos simplificados para o acesso a fundos por pequenos municípios.
  • Preservação Ambiental: Soluções locais para proteger igarapés e manguezais.
  • Bioeconomia e Desenvolvimento Sustentável: Valorização da economia local e do protagonismo comunitário.

Esse movimento, coordenado pelo Delibera Brasil, assegura que as propostas da floresta cheguem à Blue Zone, reforçando o papel da escuta e do diálogo na construção de políticas climáticas eficazes.

 

Saúde, água e justiça na pauta global

A importância das discussões desta COP reside na sua capacidade de integrar setores que antes eram secundários na agenda climática:

  1. Água no centro da crise climática

A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), representada por sua diretora-presidente, Veronica Sánchez, levará a mensagem de que a água é o principal vetor dos impactos das mudanças climáticas. A participação da ANA focará:

  • Apresentação do Roteiro da Água e do Plano Regional de Ação para Restauração de Ecossistemas.
  • Integração da agenda da água com a transição energética, segurança alimentar, biodiversidade e saúde pública.
  • Posicionamento do Brasil como referência no uso de soluções baseadas na natureza (reúso e infraestrutura verde).
  1. A saúde como estratégia climática

A AstraZeneca trará novos dados sobre a interconexão entre saúde e clima, defendendo que o combate às Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNTs) é uma estratégia de mitigação. A empresa apresentará um estudo que estima o potencial de evitar a emissão de 1.500 toneladas de CO2 em 25 anos, por meio da distribuição gratuita de medicamentos para diabetes tipo 2 via Programa Farmácia Popular. Isso se deve ao fato de que o tratamento precoce diminui a progressão para doença renal crônica e o subsequente uso de diálise, um procedimento com alto consumo de recursos.

A empresa também lançará uma pesquisa inédita na América Latina sobre a percepção da população sobre o impacto climático na saúde, com foco em doenças respiratórias.

  1. Transição Energética Justa

A discussão sobre Transição Energética ganha uma dimensão social crucial com a participação da especialista em urbanismo social Kátia Mello, da Diagonal. Ela defenderá na COP30 que o avanço da energia limpa deve incorporar a noção de regeneração territorial e o combate à pobreza energética, que afeta 750 milhões de pessoas globalmente. O debate é fundamental para:

  • Combater a morte de 3,2 milhões de pessoas anualmente devido ao uso de combustíveis poluentes para cozinhar.
  • Garantir a equidade de gênero, visto que mulheres em situação de pobreza dedicam tempo à coleta de lenha.

A pauta é garantir que a transição energética não reproduza as desigualdades históricas.

 

Restauração e inovação: compromissos concretos

O setor privado e as ONGs mostram um avanço no engajamento com metas de restauração e descarbonização, essencial para as expectativas de compromissos efetivos.

O Instituto Black Jaguar estará na COP30 para compartilhar sua experiência de restauração ecológica em larga escala no Corredor da Biodiversidade do Araguaia. A instituição promoverá debates sobre o fortalecimento da bioeconomia de base comunitária, evidenciada pela rede Ressemear, que já comercializou mais de 7 toneladas de sementes nativas, gerando renda e protagonismo para mais de 115 coletores. A restauração florestal é vista como um pilar central para que o Brasil cumpra sua meta do Acordo de Paris de restaurar 12 milhões de hectares até 2030.

Em outra frente de inovação, a Vivo reforça seu compromisso com a Amazônia, onde investe na restauração e proteção de 800 hectares. A operadora liderará um painel sobre “Telecomunicações como Pilar de Resiliência”, mostrando o impacto das redes de comunicação na gestão de emergências climáticas, um tema cada vez mais relevante diante dos eventos extremos.

A descarbonização da mobilidade também será um tema pré-COP, com a Prefeitura do Rio de Janeiro anunciando, com apoio da C40 Cities e The Climate Pledge, a meta de instalar 15 novos eletropostos públicos de recarga rápida até 2028, impulsionando a frota de carga de zero emissão e consolidando o Rio como referência em eletromobilidade.

Com essas iniciativas em andamento, a COP30 em Belém será um palco multidisciplinar e multifacetado, no qual o papel do Brasil vai além da diplomacia, exigindo coerência em suas políticas internas e a capacidade de integrar a voz das comunidades, a inovação setorial e o desafio da justiça social para assegurar que as promessas climáticas se traduzam em um legado de ação.

 

Foto: Michel Ribeiro/Delibera Brasil – divulgação

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